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‘Anos para construir e tudo vir ao chão’, diz cacica ao ver casas destruídas



A cacica da Comunidade Uka Tap+Ya, Elly de Oliveira Cordeiro (Luiz André Nascimento/Cenarium)

23 de abril de 2025

Marcela Leiros – Da Cenarium

MANAUS (AM) – Cerca de 40 famílias da etnia Kokama foram removidas de um lote no Ramal Água Branca II, no quilômetro 35 da AM-010, na manhã desta quarta-feira, 23. Como noticiado pela CENARIUM, a reintegração de posse foi requerida pela empresa Amazonas Empreendimentos Ltda., que tem como proprietários Phelippe Daou Júnior e Cláudia Maria Daou Paixão e Silva — donos da Rede Amazônica, filial da TV Globo no Amazonas.

Criança da Comunidade Uka Tap+Ya vê destroços de residência destruída (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Agentes da segurança do Amazonas, junto a servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), oficial de Justiça e advogados dos empresários, chegaram ao local por volta das 6h para remover os indígenas. Residências e plantações situadas em parte da área do lote 66 foram destruídas. “Estão quebrando tudo”, relatou a cacica da Comunidade Uka Tap+Ya, Elly de Oliveira Cordeiro.

Indígenas retiram pertences da comunidade (Ricardo Oliveira/Cenarium)

A CENARIUM esteve no local, onde conversou com os indígenas que, agora, estão sem lugar para morar. A cacica Elly compartilhou a tristeza de ver o que levou anos para construir ser levado ao chão com retroescavadeiras.

É muito difícil. Quantos anos aí demorando para construir tudo isso, para hoje vir tudo no chão. O mais difícil é saber que o advogado chega e diz que o documento que a gente tem não é válido, que o Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária [Incra] diz que não procede. Então, se o documento do Incra não vale, ninguém sabe nem a quem recorrer, então quer dizer que todos os documentos não são válido, nós não tivemos nem o direito de ficar na nossa terra, que é o 69“, declarou ela.

A cacica da Comunidade Uka Tap+Ya, Elly de Oliveira Cordeiro (Ricardo Oliveira/Cenarium)

A disputa envolve parte de uma área identificada como sendo do lote 66, ocupada pelos indígenas, conforme apurado pela CENARIUM na reportagem “Donos da filial da TV Globo, no AM, conseguem decisão judicial para remover indígenas de comunidade“. Ao lado esquerdo, no lote 69, está situada a Comunidade Indígena Uka-Tap-Y. O local, onde também residem idosos, crianças e pessoas com deficiência (PcDs), tem cerca de 22,4108 hectares.

O conflito se dá pela sobreposição de uma parte do lote 69, registrado por meio de Cadastro Ambiental Rural (CAR) do Incra no nome da cacica Elly de Oliveira Cordeiro, com esta área do lote 66, requerido pela Amazonas Empreendimentos Ltda. O documento é datado de agosto de 2024.

Documento emitido pelo Incra, em agosto do ano passado (Ofício obtido pela CENARIUM)

Eles destruíram tudo, não tivemos direito de resposta e eles falaram na cara da gente que o nosso documento não é válido sendo que aqui no ramal, esses documentos que a gente tem, eu acho que tem umas cinco pessoas que tem o mesmo documento mesmo, os documentos do Incra. Que tipo de órgão é esse que assina um documento aprovando um memorial descritivo, um georreferenciamento [sem validade]?”, questionou a cacica.

Conforme mostrado pela CENARIUM, áudio de um servidor não identificado da Funai em Manaus confirmou que houve sobreposição do lote 66, alvo da ação judicial. A data foi confirmada em uma reunião, na segunda-feira, 15 de abril, na sede da Secretaria Executiva Adjunta de Planejamento e Gestão Integrada de Segurança (Seagi), em Manaus.

“Acabamos de sair daqui de uma reunião com a Secretaria de Segurança Pública, os advogados e o pessoal todo que vai fazer a reintegração de posse na quarta-feira pela manhã. O que acontece é o seguinte. De fato a decisão é em cima do lote 66, porém a parte que vocês reivindicam no CAR de vocês tem uma pequena sobreposição, um ‘biquinho’ ali que está dentro do lote 66. Eu acho que é justamente onde estão as casas de vocês, que estão ali naquele ramalzinho, que corta um ‘biquinho’ ali do lote 66“, disse o servidor.

Mapa mostra as áreas dos dois lotes; de laranja, o lote 66; de roxo, o lote 69 (Reprodução)

Marido de Elly de Oliveira Cordeiro, o cacique Levi Kokama observou que a comunidade sente-se desamparada por instituições como a Funai e o próprio Incra. “É um desrespeito muito grande com nós, povos indígenas, porque nós pedimos socorro e nós não sabemos mais a quem recorrer e a quem confiar. Cadê as autoridades, né? Se a gente busca uma coisa legal, a gente não consegue. Mas se outras pessoas invadem, permanecem“, declarou.

O cacique Levi Kokama (Ricardo Oliveira/Cenarium)
Liminar

Em decisão liminar deferida no dia 8 de janeiro deste ano, pelo juiz Rosselberto Himenes, da 8ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho de Manaus, o magistrado deu 48 horas para os indígenas deixarem o imóvel. Em 21 de março, houve a primeira citação à comunidade. A segunda ocorreu na terça-feira, 15. Segundo relatado à reportagem, a comunidade tem dificuldades econômicas para custear advogados e órgãos como a Funai estão sendo considerados omissos nessa questão.

O juiz Rosselberto Himenes alegou, no mandado de intimação e citação para reintegração de posse, que a ação preenchia os requisitos legais para a ação, como certidão narrativa e registros fotográficos e audiovisuais que indicavam a invasão na localidade. Ele citou, ainda, o Boletim de Ocorrência registrado em 29 de agosto sobre uma invasão. Segundo a empresa, “em setembro de 2024, várias pessoas invadiram a propriedade, expulsando o caseiro, construindo divisórias e instalando barracos“.

Trecho do mandado de intimação (Reprodução)

Documento também mostra que houve a citação das lideranças indígenas sobre a ordem judicial em 21 de março deste ano. Na segunda-feira, 15, o juiz Mateus Guedes Rios determinou que o oficial de justiça Luis Alan de Almeida Lorenzoni procedesse à reintegração de posse, citando os réus — neste caso, os indígenasinvasores do imóvel“, conforme consta no mandado — a apresentarem resposta no prazo legal de 15 dias, a contar a partir da juntada do mandado aos autos do processo.

Mandado de reintegração de posse expedido em 15 de abril (Reprodução)

Outro ofício, datado de quinta-feira, 17, e assinado pelo oficial de justiça Luis Alan de Almeida Lorenzoni, apontava que a determinação judicial — que ordenou a saída dos indígenas do local em 48 horas — não havia sido cumprida.

Oficial de Justiça intimou lideranças em março deste ano (Reprodução)

Informo que a parte requerente comunicou dia 08.04.2025, e confirmado em reunião com as partes presentes dia 15.04.2025, que os ocupantes/invasores ainda se encontram ao referido imóvel situado no Km 35, AM-010, Lote 66 do 1º Cartório de Registro de Imóveis, não saindo no prazo de 48 horas para a devida desocupação voluntária, mesmo cientes do prazo concedido no dia 21.03.2025 às 10h21“, diz um trecho do oficio. Veja:

Documento que mostra que a decisão judicial não foi cumprida (Ofício obtido pela CENARIUM)

À CENARIUM, a Funai afirmou que se reunirá, nesta quinta-feira, 24, com a Procuradoria Federal Especializada (PFE), da Advocacia Geral da União (AGU), para tratar sobre a questão dos indígenas da Comunidade Uka Tap+Ya. Quanto a abrigar os indígenas no prédio da instituição, em Manaus (AM), foi informado que o mesmo está condenado, o que colocaria os indígenas em risco.

O Ministério Público Federal (MPF) também foi procurado para posicionamento sobre esse caso, mas, até o momento, não houve retorno. A reportagem questionou os empresários Phelippe Daou Júnior e Cláudia Maria Daou Paixão e Si



Fonte: Agência Cenarium

Amazonas Repórter

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