Ação que define quantidade de drogas para usuários retorna à pauta nesta quarta-feira
O Supremo Tribunal Federal (STF) não vai julgar a descriminalização da maconha. A afirmação foi dada pelo titular da Vara de Execuções Penais da Comarca de Manaus, juiz Luís Carlos Valois. O que a Corte irá decidir, no julgamento que será retomado nesta quarta-feira (6), é a unificação do entendimento em todo o país do critério que será considerado para diferenciar o usuário do traficante.
“A lei de drogas diz que o usuário não pode ser preso. Não que ele não cometa crime, ele comete, mas é um delito de menor potencial ofensivo. Ele não pode ser preso, pode no máximo ser advertido”, disse.
De acordo com o artigo 28 da Lei 11.343/2006, que está sendo questionado no Supremo, quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às penas de advertência sobre os efeitos das drogas; prestação de serviços à comunidade; e medida educativa de comparecimento à programa ou curso educativo.
A falta de critério, na lei, da quantidade de droga que diferencia o usuário do traficante provocou aumento da população carcerária. Por conta disso, ressaltou Valois, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entendeu que deveria haver uma definição.
“Eles (os ministros do STF) vão tentar criar algum critério, seja pela quantidade, seja pelo tipo de droga, o comportamento, vão tentar criar um critério para definir quem é verdadeiramente usuário na hora da abordagem policial, para que não aconteça a injustiça de a polícia prender a pessoa usuária como traficante”, destacou.
Luís Carlos Valois ressaltou que não se trata de descriminalização das drogas, pois a própria lei não permite a punição do usuário.
A leitura do juiz amazonense é semelhante a expressa pelo presidente do STF, o ministro Luís Roberto Barroso. Durante evento promovido pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), nesta segunda-feira (4), o magistrado afirmou que, antes de mais nada, espera “que a notícia seja dada de forma correta. Não há descriminalização de coisa alguma”.
“Como ela [a quantidade que define o tráfico] não está na lei, quem faz essa definição é a polícia. E o que se verifica é que há um critério extremamente discriminatório. Dependendo do bairro, de classe média alta ou de periferia, a mesma quantidade recebe um tratamento diferente”, disse.
Barroso ressaltou que o STF apenas decidirá uma regra que sirva de parâmetro para todo mundo e não pelo policial que realiza a prisão. Portanto, não se trata de descriminalizar as drogas, mas evitar o cometimento de injustiças.
Até o momento, há cinco votos pela inconstitucionalidade da criminalização do porte de maconha para consumo próprio e um voto que considera válida a previsão do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006)
Votaram nesse sentido os ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Rosa Weber, que adiantou seu voto antes de se aposentar.
Até o momento, somente Cristiano Zanin divergiu parcialmente do entendimento, afirmando que a conduta não deveria ser descriminalizada, mas que o usuário que estiver com até 25 gramas de maconha não poderá ser preso.
Herdeiro da vaga de Rosa Weber, o ministro Flávio Dino não vota neste processo.
Critério racial
Em seu voto, no ano passado, Alexandre de Moraes citou um estudo realizado pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), o qual analisou mais de 1,2 milhão de ocorrências policiais de apreensões de drogas. Os pesquisadores concluíram que pessoas pretas e pardas estavam mais propensas a serem acusadas de tráfico do que pessoas brancas.
Durante sua sustentação, Moraes afirmou que um “branco precisa estar com 80% a mais de maconha do que o preto e o pardo para ser considerado traficante. Para um analfabeto, por volta de 18 anos, preto ou pardo, a chance de ele, com uma quantidade ínfima, ser considerado traficante é muito grande. Já o branco, com mais de 30 anos, com curso superior, precisa ter muita droga no momento [da abordagem] para ser considerado traficante”.
Por enquanto, prevalece entre os ministros o entendimento apresentado por Moraes, que defendeu a fixação de presumir como usuárias as pessoas flagradas com 25 a 60 gramas de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas de cannabis.
O julgamento no STF provocou a reação de setores conservadores do Congresso Nacional. No Senado, em setembro do ano passado, o presidente da Casa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), articulada com os líderes partidários, que criminaliza o porte e a posse de substância ilícita em qualquer quantidade.
Segundo informações divulgadas pelo canal CNN Brasil na segunda-feira (4), o senador afirmou a aliados que irá pautar o tema caso o STF avance sobre o assunto. Relator do projeto, o senador Efraim Filho (União-PB) destacou que a competência “para legislar sobre o tema é do Poder Legislativo e, por diversas oportunidades nos últimos anos, o parlamento votou a favor de manter a atual legislação”.
Contudo, nesta terça-feira (5), a emissora divulgou que o parlamentar sinaliza a aliados que poderá não pautar a PEC caso o Supremo regulamente a posse de maconha, mas não altere a legislação aprovada pelo Congresso. A movimentação vem justamente após as declarações de Luís Roberto Barroso de que não se trata de descriminalização, mas da classificação da quantidade necessária para configurar porte ou tráfico. Procurado, o senador não se pronunciou.