Mulher indígena expõe água contaminada em território protegido (Reprodução/Greenpeace)
02 de maio de 2025
Fabyo Cruz – Da Cenarium
BELÉM (PA) – A Justiça Federal determinou, no último dia 30 de abril, que a União passe a fornecer água potável de forma regular às comunidades indígenas localizadas na região dos municípios de Itaituba, Jacareacanga, Aveiro, Novo Progresso e Trairão, no Sudoeste do Pará. A decisão liminar atende pedido do Ministério Público Federal (MPF), diante do agravamento das condições de vida nas aldeias causado pela seca, pelo avanço do garimpo ilegal e pela precariedade dos serviços públicos de abastecimento de água.
O chamado “Verão Amazônico” – período de julho a novembro marcado pela escassez de chuvas e pelo calor intenso na região amazônica – é a preocupação de lideranças indígenas, como da coordenadora da Associação das Mulheres Munduruku Wakoborun, Ediene Kirixi. “No ano passado, foi precário. Na emergência, a associação ainda conseguiu furar 12 perfurações de água com recursos próprios, mas muitas aldeias ainda estão em situação difícil. O Rio Tapajós está descendo, vazando, e os igarapés das aldeias também estão secando. Por isso nossa preocupação aumenta com a chegada dos meses de julho, agosto e setembro”, disse à CENARIUM.
De acordo com a liminar, o governo federal, por meio do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Tapajós, terá 20 dias, após ser oficialmente notificado, para iniciar o fornecimento de água potável. A distribuição deve ocorrer mensalmente, até o dia 10 de cada mês, por meio de caminhões-pipa, galões ou outras formas adequadas. Em caso de descumprimento, a União poderá ser multada em até R$ 100 mil.
A decisão da Justiça levou em consideração relatórios da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde (MS), que reconhecem os riscos à saúde, higiene e alimentação das comunidades por conta da falta de água. Mesmo diante da gravidade da situação, o governo federal ainda não apresentou soluções emergenciais.
Leia a decisão:
A seca histórica que atinge a Amazônia intensificou o drama vivido pelos povos originários. Com a queda drástica no nível dos rios e a contaminação da água por mercúrio – decorrente da mineração ilegal –, aldeias inteiras têm recorrido a igarapés poluídos para suprir necessidades básicas. Um estudo citado pelo MPF identificou presença de mercúrio em 87,5% das amostras de cabelo de indígenas da aldeia Sawré Aboy. A exposição ao metal pesado, principalmente pelo consumo de peixes contaminados, pode causar graves problemas neurológicos, motoros e cognitivos – especialmente em crianças.
A situação também reflete o desmonte orçamentário de políticas públicas voltadas aos povos indígenas. Segundo perícia técnica do MPF, entre 2014 e 2024, o Dsei Tapajós teve uma redução real de 87% no valor investido por indígena. A projeção atual indica que, no ritmo adotado, levaria até 21 anos para que sistemas permanentes de abastecimento de água fossem implementados em todas as aldeias.
Embora o Dsei tenha apresentado um plano para instalação de sistemas de abastecimento até 2027, a Justiça considerou a medida insuficiente para garantir os direitos fundamentais das comunidades. A decisão destaca que é preciso assegurar o acesso imediato à água potável, considerando o agravamento da crise hídrica e sanitária.
A reportagem solicitou posicionamento ao Ministério da Saúde. A pasta informou que está acionando sua área técnica e solicitou mais tempo para responder aos questionamentos. A CENARIUM permanece à disposição para atualizar as informações.
Leia mais: Rio Marupá ‘morre’ sem água após degradação de garimpos ilegais no Pará
Editado por Adrisa De Góes
Revisado por Gustavo Gilona
Fonte: Agência Cenarium