Por Bia Abramo
Na semana em que Donald Trump tomou posse, Anna Olímpia de Moura Leite, estudante de doutorado na News School, Nova York, recebeu uma mensagem no grupo de mães da escola de seus filhos de 2 e 4 anos, que acendeu o alerta de perigo e o clima de medo generalizado entre imigrantes.
“Espero que todos estejam cuidando de si mesmos e de seus pequenos nesta semana difícil. Como vocês podem ou não saber, este governo enviou o ICE [sigla para Immigration and Customs Enforcement’s ] para várias cidades com o objetivo de prender e deportar imigrantes em massa, e Nova York está na lista.”
“Tem um clima de medo no ar. As pessoas estão ali esperando para ver o que vai acontecer de fato, se vai para frente ou se vai ser uma ação midiática”, ela conta. “Está todo mundo preocupado com o fato de ter gente do governo indo bater de porta em porta. Aqui em Nova York fizeram isso no Bronx.”.
Anexado à mensagem, veio um card bastante didático sobre as formas legais de reagir caso alguém testemunhar alguma operação do ICE e link para outro arquivo contendo um cartão com instruções em inglês, espanhol, chinês, árabe e creole hatiano sobre os direitos constitucionais dos imigrantes.
Anna Olympia mora com a família no Brooklyn, bairro que abriga imigrantes de diversas origens desde o século 19. As crianças, em idade pré-escolar, estão numa escola de pedagogia linha Waldorf, em que as aulas acontecem, em boa parte do ano, nos bosques do Prospect Park. “É uma escola de perfil alternativo em que muitos pais trabalham, nas indústrias criativas, do audiovisual e da música, e que tem um perfil mais mais progressista, mais politizado.”
Ela, que está em Nova York desde 2022, diz ter ficado surpresa de como muitos pais da escola estavam informados sobre as eleições brasileiras. Por isso, não foi supresa que a maioria dos pais com quem Anna e o marido convivem tenham se engajado nas eleições presidenciais ao lado dos democratas. “Dava para perceber um tom de esperança na galera.”
‘Existe muita suspeita e muito medo’
Logo depois que veio o resultado das eleições presidenciais, relata Anna, “a prefeitura da cidade de Nova York compartilhou um vídeo no seu canal oficial do Instagram que afirmava que nenhum direito seria perdido, que essa cidade é construída pela diversidade, é construída por imigrantes de todos os países, e aqui nada vai ser perdido. Essa foi uma declaração bem forte no sentido de uma disposição da cidade em enfrentar as políticas trumpistas”
“A cidade de Nova York tem sempre foi muito progressista dentro da realidade norte-americana. Agora, depois da pandemia começou a aumentar muito o número de imigrantes, que vem sem grana, sem moradia. O fato é que o poder público tem de construir mais abrigos e mais escolas e esse já era um ponto de tensão mesmo na admnistração Biden.”
Estima-se que 11 milhões de imigrantes vivem nos EUA sem documentação, segundo dados do Pew Research Center. “É um número muito alto. Agora, isso de ficar sem documento nos Estados Unidos até então era visto como algo normal. Você trabalha, você tá ali fazendo… A pessoa vive uma vida normal. Sempre isso foi visto como uma situação de normalidade.”
Ela tem situação regular, com Green Card garantido pelo fato de o marido ser cidadão norte-americano, mas teme pelo seus vizinhos e conhecidos do bairro em que mora. “A verdade é que o medo é a palavra. Existe muita suspeita e muito medo. As pessoas estão bem chocadas e preocupadas com o futuro da democracia nos Estados Unidos”.
No dia seguinte ao resultados das eleições de Trump, Anna conta que a professora mandou uma mensagem para o gupo de pais muito cedo, que dizia: “Na última vez que isso aconteceu, meu colega ofereceu esta citação fortalecedora: ‘Eles tentaram nos enterrar/ mas não sabiam que éramos sementes’ (provérbio mexicano)”. E ela ainda disse: “Nossa função é criar crianças que tenham compaixão, então não vamos perder as esperanças.”